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domingo, 24 de junho de 2012

História do Jardim do Mina/Matias Barbosa/MG - Bem Imaterial


História do Jardim do Mina/Matias Barbosa/MG

Bem Imaterial

 Fogueira do dia 23/06/2012
Vista parcial da cidade de Matias Barbosa
O Jardim do Mina é uma região da zona rural de Matias Barbosa. É uma área de produção agrícola e também de minas de extração de caulim e cristal. Segundo os moradores da localidade, antes de ser denominada Jardim do Mina, o lugar era conhecido como colônia por causa dos italianos que ali moravam. Já o nome Jardim do Mina viria da presença das minas e o termo jardim estaria relacionado à presença de pomares e plantações de hortaliças. Não sabemos se existe mesmo uma correlação do nome do local com as atividades econômicas nele exercidas, mas essa é a crença vigente. Em relação ao nome colônia está relacionada a imigrantes. A parte baixa do Jardim do Mina era conhecida como Goiabal porque havia diversos pés de goiaba em todo a baixada. No alto, encontram-se as minas e era conhecido como Jardim do Mina.

A região do Jardim do Mina era o lugar onde moraram os italianos que chegaram a Matias Barbosa para trabalharem na lavoura de café. No último quartel do século XIX, cafeicultores contrataram italianos em substituição da mão-de-obra escrava, processo que vinha acontecendo mesmo antes da abolição. Nos anos de 1880, o fluxo de italianos para Minas Gerais trouxe cerca de setenta mil imigrantes ao Estado que foram especialmente para Juiz de Fora e São João Del Rey. Matias Barbosa está na região de Juiz de Fora e recebeu inúmeros imigrantes que se fixaram no Jardim do Mina, local conhecido como Colônia. Pela atual distribuição das terras do Jardim do Mina, os italianos acabaram comprando pequenos sítios para viverem e plantarem.

As terras do Jardim do Mina que pertenciam ao Cel. Otávio foram divididas entre seus filhos quando ele faleceu e se transformaram em pequenas propriedades. A casa da fazenda fica ao lado da Capela de Santo Expedito e ficou para o Sr. Júlio Maria de Almeida. Ele era casado com D. Luzia que ajudou a construir a capela doando o terreno e pedindo esmolas para a comunidade. Ainda no século XX, a região explorava as minas de caulim e cristais, mas a política de meio ambiente embargou a mineração, proibindo a extração do mineral da terra. Isso diminuiu muito a população da localidade que se mudou para a cidade de Matias Barbosa. Além disso, houve um êxodo das pessoas do lugar para a cidade o que também influenciou na diminuição da produção de hortaliças que alimentavam o mercado de Juiz de Fora.

Atualmente, o Jardim do Mina fornece poucos víveres para o mercado das cidades de Matias Barbosa e Juiz de Fora. Sua população diminuiu muito por causa da facilidade de transporte entre Matias Barbosa e Juiz de Fora, o que leva muitas famílias a se estabelecerem na cidade e trabalharem e estudarem em Juiz de Fora. Apesar desse quadro de urbanização ocasionado pelo crescimento e desenvolvimento de Juiz de Fora, a região ainda mantém suas tradições e realiza todo ano a Festa da Fogueira, ou festa de São João, e a de Santo Expedito, padroeiro da capela local.



A Capela de Santo Expedito

 Interior da Capela de Santo Expedito - Jardim do Mina

A Capela de Santo Expedito foi construída pela comunidade com o apoio de D. Luzia de Macedo Almeida e seu esposo, Sr. Júlio Maria de Almeida. Antes do templo, os fiéis da comunidade se reuniam na casa do Sr. Antônio Pigozzo. Depois disso, eles construíram um cruzeiro no alto do morro, onde os fiéis se reuniam para rezar o terço. Esse cruzeiro ficava no mesmo lugar que o atual, mas ele era todo de madeira. As terras eram do Sr. Júlio Maria de Almeida e D. Luzia de Macedo Almeida. O casal, muito devoto, resolveu doar um terreno para a construção da capela, mas não haviam decidido onde. O mascate, Sr. Sebastião Bezerra, viu a dúvida de D. Luzia e apontou o alto do morro, onde fica a capela, para que lá fosse erguida a igreja e disse que traria a imagem do padroeiro – Santo Expedito. Cada família do Jardim do Mina ofereceu uma imagem que compõe o acervo da capela. D. Luzia e seu marido doaram o terreno e os construtores foram os Srs. Ângelo Luiz Pigozzo, Antônio Meroto, João Armindo Thomaz e Joaquim Clemente. O engenheiro responsável pela obra foi o Dr. Odilon Pereira de Andrade. A comunidade realizou festas para angariar mais recursos para a construção da igrejinha e, em 19 de abril de 1958, a obra foi inaugurada. Até aquele dia, ninguém tinha ouvido falar de Santo Expedito, mas pouco tempo depois, os fiéis do Jardim do Mina já estavam devotos do santo. Ele é conhecido como o santo das causas justas e urgentes. Foi um comandante romano que se converteu ao cristianismo e foi morto pelo Imperador Diocleciano em 19 de abril de 303 d. C., mesmo depois de ganhar uma importante batalha para o Império Romano. Foi cruelmente assassinado e teve seu corpo mutilado. É um santo mártir.

A fé em Santo Expedito se espalhou pelo Jardim do Mina e a comunidade faz anualmente uma enorme festa em honra ao santo que reúne inúmeros fiéis. A festa de Santo Expedito é considerada a festa financeira da capela cuja data de celebração nem sempre coincide com o dia do santo porque os festeiros marcam a data para uma noite de lua cheia.

Muitas vezes, ela é feita no início do mês para que os participantes gastem mais nas barraquinhas e a igreja arrecade maior quantidade de dinheiro. Com esses valores, a comunidade pode melhorar a capela e construir um grande salão de festas com cozinha e banheiros e garantindo mais conforto para os participantes das festas da capela do Jardim do Mina.

A partir de 1992, a capela passou a sediar a festa de fogueira que tomou proporções tão grandes quanto a festa do padroeiro. A capela fica num local privilegiado, no alto de um morro, e pode ser avistada de quase todo o Jardim do Mina. Nos dias de festa e de missa, a responsável pela chave da capela, D. Maria Tereza, conhecida como D. Mariinha, acende as luzes que são vistas ao longe e os moradores da comunidade ficam sabendo que há orações na capela.



Festa da Fogueira em Matias Barbosa
Momento antes da passagem dos fiéis na fogueira de São João
Em Matias Barbosa, não sabemos se os moradores da localidade realizavam a celebração do dia de São João antes da segunda metade do século XX, mas provavelmente o santo era homenageado em seu dia, já que a tradição dessa festa é bem difundida em toda Minas Gerais e Brasil. Nos anos de 1950, a festa propriamente dita começou a ser comemorada no Jardim do Mina, zona rural do município de Matias Barbosa. Ela era feita pelo Sr. João Belmiro em suas terras. Ele morava em um sítio no Jardim do Mina com sua família e plantava hortaliças que eram vendidas em caminhões na cidade próxima de Juiz de Fora. Era casado com D. Emengarda Belmiro e teve vários filhos: Oscar Belmiro, Gabriel Belmiro, José Maurício Belmiro, Guri Belmiro, Isaíra Belmiro e Neném Belmiro. O Sr. João Belmiro fazia a festa nas noites do santo. Armava a fogueira à tardinha do dia 23 e atravessava as brasas à meia noite do dia de São João. O Sr. Belmiro já faleceu e não sabemos de onde ele trouxe o costume de comemorar o dia de São João. A atual festa da fogueira acontece porque suas práticas foram aprendidas pelo Sr. Vicente que participava do evento realizado pelo Sr. Belmiro. Ele passou pela fogueira pela primeira vez aos treze anos de idade e se encantou com a prática e com o ato de fé a ela associado.

A festa da fogueira feita pelo Sr. Belmiro durou até a década de 1960 quando ele vendeu parte de seu sítio para o sogro do Sr. Vicente, o Sr. José  Paschalini, e se mudou do Jardim do Mina. O desejo de manter a tradição foi mais forte e, nos anos de 1970, o Sr. Vicente resolveu refazer o ritual. Chamou seus cunhados e organizaram a festa da fogueira no sítio do Sr. Paschalini. A celebração era feita em terras particulares, mas a população do Jardim do Mina, que naqueles era maior que a atual, ia em peso para o evento. Ela continuou nas terras do Sr. Paschalini até 1992 quando passou a ser realizada no terreno ao lado da igreja de Santo Expedito, pertencente ao Sr. Onofre Otávio de Almeida, mas que se assemelha a um largo da capela.

As festas foram realizadas normalmente todos os anos, sem maiores questões que as diferenciasse da tradição. Uma missa antes de começar o show da banda de forro e da quadrilha. Em geral, cerca de dez a vinte pessoas passavam anualmente pelas brasas e outras tantas, cerca de cem a duzentos, participavam no evento festivo. Nesse dia, cerca de vinte pessoas passaram pela fogueira e manifestaram sua fé em São João. Apenas dois fiéis se cumprimentaram no meio das brasas como era de costume antigamente.

Em 2009, foi filmada pela Prefeitura de Matias Barbosa com o intuito de registrar a importante manifestação do Jardim do Mina e no ano de 2011 a Festa foi registrada como Bem Imaterial através do Decreto Municipal, nº1643 de 06 de janeiro de 2011.



A festa

A festa acontece na noite de 23 para 24 de junho, dia de São João. Segundo D. Mariinha, o Sr. Vicente se reúne com seus filhos ou irmãos e ele cortam uma enorme árvore cuja madeira vai ser queimada na fogueira de São João. Isso é feito algum tempo antes da festa, podendo ser até um mês antes, para que a madeira fique seca e queime facilmente. Uma semana antes os organizadores da festa começam a conseguir doações para fazer a canjica e os cachorros-quente que serão servidos de graça para os participantes. Além desses alimentos, cada participante chega à festa com garrafas de refrigerante e pratos de salgado ou doce que serão oferecidos junto com a canjica e os sanduíches.

No dia da festa, de manhã ou à tarde, o Sr. Vicente ajeita a madeira moldando a fogueira que tem o aspecto de um cone. Nos últimos dois anos, a festa foi filmada e os participantes deram entrevistas falando sobre suas impressões acerca do evento e seus testemunhos de fé.

Por volta das 18 horas, o Sr. Vicente acende o fogo e dá-se início à festa. Nessa hora, o largo da igreja ainda não está cheio e apenas os fiéis mais fervorosos aparecem para a celebração da missa que acontece assim que o padre chega da matriz de Matias Barbosa, logo depois de acesa a fogueira, entre as 18:00 e 19:30.

Os padres responsáveis pela celebração da missa são os mesmo da paróquia de Nossa Senhora da Conceição de Matias Barbosa. Eles celebram os ritos católicos e membros da comunidade do Jardim do Mina lêem palavras sobre São João Batista e trechos da bíblia, além de entoarem cânticos em honra ao santo. A missa é realizada no salão da Capela porque a mesma é muito pequena e não cabem todos os fiéis que comparecem para a festa.      Segundo o Sr. Vicente, a missa atrai apenas alguns devotos que, em geral, são da própria comunidade, mas após a celebração, outros participantes chegam para festa.

Após a missa, a banda de forró começa a montar os instrumentos para iniciar o show. Eles animam a festa e alguns casais dançam ao som da música regional. Enquanto a banda toca, os voluntários vão para a cozinha e iniciam a partilha dos refrigerantes, salgados, sanduíches e a canjica. Não há bebida alcoólica a não ser por algumas garrafas de destilados que alguns participantes levam, mas em respeito à festa, eles ficam no estacionamento e não entram com as garrafas no salão. A comida é servida no balcão é não é cobrada, sendo assim ocorre à partilha entre todos os presentes.

Depois de servido o lanche, os participantes vão dançar quadrilha, a dança típica das festas juninas e que é uma adaptação das danças da corte francesa dos séculos XVII e XVIII. Nessa hora, todos os presentes se juntam em uma enorme roda e brincam aos pares.

Quando não há homens e mulheres na mesma quantidade, mulheres e mulheres dançam juntas. Enquanto a festa acontece no salão da capela de Santo Expedito, outros participantes ficam do lado de fora, sentindo o frio do inverno que se inicia e o calor das chamas da fogueira.

Por volta de dez minutos para a meia noite, os participantes se reúnem em torno da fogueira. O Sr. Vicente tira as toras de madeira que ainda não se tornaram brasas e espalha as brasas que se formaram. Segundo o Sr. Vicente, à meia noite, o “fogo fica mais fraco” e as águas diminuem. A crença na diminuição da intensidade do fogo e das águas é uma constante no imaginário em torno da festa de São João e é por essa característica da noite de São João que possibilita a passagem na fogueira.

Depois de reunido o público e ajeitadas as brasas, aqueles que têm coragem e fé para atravessar as brasas, tiram os sapatos. Todos rezam um Pai Nosso e uma Ave Maria e esperam até dar o horário de meia noite em ponto. Nessa hora, eles se posicionam e passam pelas brasas em fila indiana, um pé na frente do outro e olhando para frente. É um exercício de fé para esses homens e mulheres.

Os observadores ficam impressionados com a coragem dos fiéis em São João que pisam descalços nas brasas da fogueira. Depois de passarem sobre as brasas, eles mostram os pés para aqueles que ficaram de fora apenas vendo o ritual. Esse ato é feito com orgulho porque seus pés sem queimaduras  representam o símbolo de sua fé no santo. O fogo da festa de São João tem um caráter sagrado e sua transposição tem o sentido de prêmio diante da fé e da coragem. A hora de transpor as brasas é considerado pelos fiéis uma vivência sagrada, um vínculo com a divindade. Naquele momento as pessoas se redimiam de sua vida de pecado e demonstravam sua crença e fé. Após o ritual de atravessar as brasas, o público se dispersa e do local se esvazia. A partir daí, os organizadores da festa começam a guardar as comidas que sobraram e a limpar a área. Com o fim da festa, o rito cíclico retorna e no outro ano os participantes se preparam para outro ritual de renovação de fé e passagem da fogueira.

 Os fiéis se preparando para caminhada sobre as brasas




Festa da Fogueira: Bem Imaterial de Matias Barbosa

O registro do bem imaterial a Festa da Fogueira, sendo uma manifestação cultural e religiosa que envolve toda comunidade do Jardim do Mina e do município de Matias Barbosa. 
            Sua a fundamentação de base cultural e religiosa se remonta das antigas tradições pré-cristãs européias. A Festa de João, celebrada em 23 de junho para os cristãos, coincide com a chegada do verão no hemisfério norte e do inverno no hemisfério sul. Foi implantada no Brasil pelos portugueses no período colonial. O costume de celebrar a chegada da estação, associada à fé no santo precursor de Cristo, que engendrou inúmeros ritos marcados pelo acender de uma fogueira e seu transpor pelos fiéis.

O registro do bem imaterial Festa da Fogueira a nível municipal do perímetro que contempla a Capela de Santo Expedito, justifica-se por sua manifestação cultural e religiosa de indiscutível valor histórico imaterial, onde inúmeros fiéis e curiosos se reúnem pra celebrar juntos o nascimento do precursor de Cristo, São João Batista, fazendo parte da identidade dos moradores do Jardim do Mina e de Matias Barbosa.
Decreto Municipal - Festa da Fogueira como Bem Imaterial Municipal

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